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NAS ÁGUAS

Nas águas tranquilas que cobrem esse solo isolo a tristeza que pesa nos ombros em dores prováveis, possíveis assombros que escondem o sorriso que sempre foi seu Nas águas tão calmas, mergulho meu colo consolo a verve que andava arredia; pedinte de um vento, brisa ou poesia espera voltar o que sempre foi seu Nas águas serenas, meus versos, imolo tentando acalmar a alma em estado bruto para que, tranquila, num tom resoluto retorne ao caminho que sempre foi seu NAS ÁGUAS - Lena Ferreira -

CORTE

Debruçada na beirada das lembranças chorosa contempla a imagem do tempo que corre, indiferente ao seu lamento, ...e não para Eram tantas, lembra bem, e por horas brindavam a vida com xícaras de brisa morna e gargalhavam com as cócegas do vento Assistiam, reflexivas, ao degradê da tarde e à noitinha, respiravam estrelas e vagalumes brincavam de fazer o dia, a vida e a sorte Debruçada na beirada das lembranças arqueou-se pelo peso da saudade daquelas que foram levadas por um corte ...que não sara CORTE - Lena Ferreira - dez.13

DECANTAÇÃO

Escorre desesperada do leito, caminha aflita e forma um denso rio; a água amarga que vaza do peito desliza da fonte estreita em fio... Desloca-se da fonte tão pequena, e, diminuindo, decanta das águas os desenganos, lamentos e penas, e, desfilando, destila o que amarga Na trajetória, nem pouca, nem tanta, modifica seu gosto enquanto escorre tornando doce a água que envenena Alaga o peito e destrava a garganta afogando a mágoa que, enfim, morre e a fonte estreita, se alarga, serena DECANTAÇÃO - Lena Ferreira – out.13

SUAVE

Senti a dor de cada letra nua expondo a alma; de tristeza, morta vestida de verdade, dor tão crua daquela fina que, por pouco, corta Senti  as lágrimas rolando - as duas - batendo desde cedo à tua porta quisera, mesmo, transmutar-me e  lua alteraria as bases da comporta E a noite, silenciosa como a brisa, acalmaria a dor que aterroriza vestindo-te com flores e sorrisos Perfumaria-te com puro nardo suave, como as nuvens que resguardo para curar-me, sempre que preciso SUAVE  - Lena Ferreira –

PRETENSÃO

Ah, Mário, se por aqui ainda andasses com pés de passarinho e letras aladas quintaniando o teu silêncio, confirmarias o alvo certo do teu aforismo sobre o tempo que com passos assustadoramente fungíveis engole fatos, fotos, ventos, velas, elementos vulneráveis sentimentos; bem dissestes  tanto tempo e o dito permanece imutável a não ser pelo próprio espaço que, caduco não consegue acompanhar a avalanche de informações que chegam de toda parte e reparte a mente em tantos pedaços sem que, cada parte partida, absorva verdadeiramente, o que há em cada fato Os tempos são outros, Mário, são sim; adornam a distância com  a própria distância entornam à inconstância mais inconstância em toques progressivamente superficiais porém tranquilizo-te, poeta:  como tu, deitei-me nas citações dos outros sobre mim e assim, sereníssima, tranquila, calma e equilibrada andarei sob essas impressões atemporais sob a promessa de não levar para o túmulo o acúmulo do tudo que posso fazer no agora PRETENSÃO - L

CÍCLICA

Há vezes, abro-me ao sol que cirandeia pelo oceano suspenso esquecida das noites despertas entre as nuvens estéreis A luminescência do dia acelera o meu pensamento que salta, saltita e orbita pela mente em euforia de cores vibrantes sorrisos, canções e canções em ondas e ondas “Tenho fases...” Há vezes, fecho-me, aberta aos cíclicos pensares segundos e segundos em variantes variáveis sem resumos e sem cálculos; solução salobra escorre pela face desbotada e sem ser sol trovejo, abalando os alicerces da alma inquieta “...como a lua.” Reveses...E o ciclo das marés avoluma a angústia de um vazio que nada é capaz de preencher O sorriso salgado afasta as estrelas; sei bem mas o céu é imenso e essas luas madrugadas trazendo a brisa da inconstância me apavoram “Perdição da minha vida!” Mas há de vir um vento, um dia ou noite qualquer, que arraste essa instabilidade a um precipício assassinando, em mim, a inércia agigantada diante da poeira soprada pela rua escura e fria devoradora da calma que

RE-CREIO

Dentro de um poema, dormem outros poemas aguardando serem despertos. Leio e releio. Recrio, re-creio; acordamos... RE-CREIO - Lena Ferreira -

INTERMITENTES

Certas verdades, intermitentes, bordadas por gazes finas, transpassadas perpassando as fases de uma vida em cela revelam o vício dos vínculos convenientes Ingenuamente, trazem o fim para o início fundam precipícios nos verbos contritos acordando atritos no poro indisposto; desgosto em arrepios, anunciam conflitos Certas verdades, intermitentes, atadas por nós mudos, surdos e cegos confrontam o ego de um mundo absurdo e deixam escapar o que ia na palma... (...diante de tantas mentiras calmas) INTERMITENTES – Lena Ferreira – dez.13

DE PASSAGEM

No curso da longa estrada vou traçando meu destino cansativa é a caminhada muitas vezes, vou sozinho desbravando esse caminho sem escudo, sem espada atravesso as correntezas carrego poucas certezas pra bagagem ser mais leve na passagem que é breve vou bebendo da beleza que a paisagem me oferece tenho o sol que me aquece tenho a chuva no meu rosto e a brisa, prima-irmã do vento revigora esses meus passos e amenizando o cansaço tranquiliza o pensamento do muito que acontece porque os olhos não esquecem do que corre pelo mundo coração em disparada; pouca coisa sendo nada muita coisa sendo tudo ...no curso da longa estrada vou seguindo, quase mudo DE PASSAGEM - Lena Ferreira - dez.13

ZELO

E enfim, o silêncio dos dias solitários cedeu lugar ao alvoroço pela volta enfim, a ventania transformou-se em brisa mole; felicidade é pra se beber de gole em gole Olhos sorrindo tateando tudo em volta lábios abrasados, se abraçando e a cada toque, uma porta era entreaberta; se zelo existe, haverá redescobertas Caminhando, calma, a mesma lua, leve suspirava e, talvez, por inveja breve, escondeu-se nas nuvens raras dessa noite E nós, sob juras secretas, em suavidades cobertos de pele e de intimidades inauguramos estrelas onde o céu fez greve ZELO – Lena Ferreira –

IMENSURÁVEL

Já era tarde e o meu silêncio, a companhia além da lua, grávida de vãs promessas bisbilhotavam o quarto inteiro à procura de algum resquício do passado já dormente Mas estampado estava, há muito, em cada canto em cada foto e nas ranhuras das paredes e a velha rede balançava com as lembranças de um presente, vivo e intenso, entre sóis Então, sozinhos, eu, a lua e esse silêncio dialogamos; entrelinhas, fio a fio: não é um vazio, é só um poço imensurável dessa saudade de quem parte e quer ficar IMENSURÁVEL - Lena Ferreira -

PREFIXO

Trago de berço o prefixo de um céu líquido E a imensurável inconstância dessas ondas sempre me sonda e me remete a vazantes; gotas, poças, lagos, rios, mares, oceanos... Não é um plano arquitetado; é o efeito do que no peito roça e arranha em agonia Nascidas frias, rimas batem nos rochedos e morrem cedo, amênicas de maresia Verso com limo, pedras, algas verde-musgo e no quê profundo do raso mundo que alcanço, avanço e a calmaria, com um beijo, me azuleja Que assim seja; apaziguo-me com o vento que, neste momento, sopra leve, quase brisa e me avisa, num vaporoso e eterno abraço Que esse cansaço que, às vezes, me abate é pelo embate inglório, por noites e dias entre as suadas ventanias e as águas de mim PREFIXO – Lena Ferreira – dez.13

TANGENDO NUVENS

Imagem
*** Enquanto um vento-menino, brandindo o seu chicote de plumas, suave, brinca de tanger as nuvens esparsas de um céu azulejado, permito-me um observar quase sensato sobre as imagens diversas que se me apresentam em impacto. Figuras das mais várias formas se formam em poucos instantes e, quase no mesmo instante, outra forma e outra vez. Talvez só para lembrar que, da mesma forma que as nuvens, na vida tudo muda, tudo é transformação e, muitas vezes, independe de mim...de ti ou de voz... Então, re-corro ao maço de folha em branco e com o pensar franco, abraço essa inspiração como sendo uma tábua de  salvação. E apontando impressões, escrevo, rabisco e escrevo de novo o que devo e não devo, o que penso, o que sinto, o que invento e o extinto; fotografo emoções. Sensações que, percorrendo as veias, geram memórias cheias, esvaziando a razão. Onde a solução? Onde me fiz refém? Ah, coração...Aquieta-te no peito e daremos um jeito nessa nossa questão: ou freamos o vent

SACODE

Não sem aviso, veio forte e cego e laminado, arrancou-me telhas, tirando o chão do eu, do id e o ego virou poeira que não se espelha Temi, tremendo - isso eu não nego - perder o todo que se assemelha à calma, à paz e tudo o que carrego dentro do peito em ínfima centelha - o céu trincado em grandes estrias lembravam as rugas dos passados dias e as trovoadas, gritos de improviso - Não sem aviso, sacudiu-me o vento; tombou certezas do antigo tempo e fez-me chuva no instante preciso SACODE - Lena Ferreira – dez.13

SONHO

Enquanto a noite anda, vagarosa, de braços dados com uma leve brisa o pensamento dorme e concretiza a viagem mais perfeita e esplendorosa É quando, em veste fina e vaporosa, compromissadas almas, sintonizam os fios de promessa e minimizam a espera, demorada mas zelosa Enquanto a noite, com seus passos lentos, caminha, almas com o peso do vento, flutuam e partem pr'esse encontro breve Marcado com suas almas prometidas - quando acordadas, vagam adormecidas e só despertam quando dormem leves - SONHO – Lena Ferreira – dez.13

SOU-TE

E quando vens, me abraças com palavras mansas, ternas como a brisa levemente salmourada, quase, quase maresia- essa mesma que me beija quando em mares, poesia. - Tanto orgulho de ser seu mar, assim, idêntico em conflito...Marés tantas, ond as fartas; falta-me o ar, confesso, muitas vezes, mas não resisto a esse amar intenso e insano, tão inteiro e tão distinto... Há vezes, penso tanto, penso muito...Um pensar inconcluso, tão confuso que nem sei se um de nós é o infinito ou se é somente pelo atrito da areia entre os dedos que a razão, que julgo vasta, escasseia e, pelos vãos, vão os segredos... Mas quando vens entre sussurros tão macios e alarmas meus verões, cobrindo-me com suados arrepios, mudando o fuso, o eixo e o mundo, acordando outras estações já dormentes no meu peito, que livres da clausura, incitam variadas explosões, deliro! Ah...Não sou a última nem a primeira, sei bem, mas te digo, despida de pudores e vestida de ternura: dia e noite, noite e dia, so

AMOR PRÓPRIO

Quando digo que me amo não é por capricho ou vaidade Quando digo que me amo não é por falta de humildade Quando digo que me amo é por compreender essa verdade: Se eu, que sou eu, - me conheço -, não me der o amor que mereço não saberei dar amor a ninguém E que amor darei a quem desconheço se não souber amar a quem conheço? responda-me essa questão, meu bem AMOR PRÓPRIO - Lena Ferreira - dez.13

DENSOS

Há quem diga que o que distancia nos separa mas não acredito pois com o toque de uma poesia alma, mente e corpo teus, eu sinto Há quem diga que essa lonjura marmoriza o sentimento a dois leio os versos, todos de ternura; e a distância, deixo pra depois Entre nós, há um largo oceano e profundo, isento de enganos, em pensares densos de desejos Suas ondas, calorosas, quentes, vindo à tona, todas displicentes, dão-te, longe, imaginados beijos DENSOS - Lena Ferreira – nov.13

DEZEMBRO-ME

Dezembro-me pois Ipanema me chama para dourar os meus pelos e beijar a minha face morena E a brisa morna convida a um passeio distinto entre os beijos discretos da areia com as ondas amenas Dezembro-me pois o Arpoador me acena  para admirar o por do sol de mãos dadas com a cena E as pedras úmidas de maresia puxam conversas idosas entre um sopro de vento e um gole de noite plena Dezembro-me antecipando, verão Oxum conclamando bela, amorosa e sirena: desfila tua felicidade, Serena DEZEMBRO-ME - Lena Ferreira -

COMBINADO?

Então fica combinado que, a partir de agora, não voltaremos ao passado inutilmente. Que sejamos, tão somente, visitantes breves dos fatos que mereçam ser repetidos e não seus hóspedes permanentes. Que sejamos honestos ao olhar os acontecime ntos que nos causaram decepções com maturidade suficiente para reconhecer que nem sempre o erro foi do outro; assimilar, aprender e seguir em frente com o autoperdão. Que não sejamos meros expectadores do nosso futuro, nem de leve, e sim, trabalhadores árduos neste merecido presente. Combinemos que, com sutilezas, ergueremos pontes e derrubando muros, alargaremos horizontes. Retirando o pó das palavras construtivas – ouvidos atentos aos detalhes que o vento nos traz – iremos além. Que sejamos, de fato, presentes - modo e adjetivo - e tenhamos motivos de sobra para comemorar o simples fato de estarmos vivos. COMBINADO? - Lena Ferreira - abr.13

ALÉM DA FACHADA

Ao andar pelas ruas do meu bairro, vejo casas diversas. Algumas velhas, bem antigas, caindo aos pedaços, jardins mal tratados. Outras, reformadas, exibem um certo luxo. Outras, poucas, novas, aparentam alegrias...Umas com suas portas e janelas trancadas por esse ou outro motivo. Outras, com frestas convidativas e sorridentes. Mas esses detalhes são apenas sobre suas fachadas. Não podemos ver o que acontece lá dentro, só de passagem. Quem sabe na casa em ruínas, residam riquezas... Quem sabe na casa-sorriso, residam tristezas... Quem sabe na casa trancada perderam uma chave; a da confiança.. Para sabermos, é preciso que, consentidos, entremos e convivamos por um mínimo de tempo em cada ambiência. Avaliando somente por fora e à distância, corremos o risco da mera ilusão que nos faz reféns da aparência; não raro, desprezamos a essência. Ao andar pelas ruas do meu bairro, como num vai e vem, penso na vida e nessa analogia: somos casa também... ALÉM DA FACHA

AMARCURA

Olhei pro alto e lá estava ela a censurar a tola atitude com um tom tão doce, tão suave e bela; tão diferente do meu tom que, rude, Faz deslizar, em suposta esparrela, minh'alma que, por bem pouco, se ilude e iludida, tem como sequela distanciamento em fuga amiúde Mas a censura tem seu fundamento fechando os olhos, mudo o pensamento: pra alma ferida, somente amar cura Tão belo e doce é esse ensinamento que a lua deu-me e não muda com o vento: bem pouco vale a vida sem ternura AMARCURA - Lena Ferreira - nov.13

SILENCIAMENTO

Prenuncio o precipício do que foi um terno início. E o indício mais que claro é o diálogo difícil. Um passo a mais e é o abismo . Um a menos, o conformismo. Um ou outro, engolindo o sentimento que, por tempos, pensei nós. Mas... Muitos nós alargaram os hiatos entre os sóis...e os sós. Eu, que nasci com impulsos na ponta dos dedos e gritos na ponta da língua, surpreendentemente, sentencio-me ao silenciamento. Deixa assim... Se mais tempo permaneço falando e falando e gritando e gritando, insistentemente reclamando pelo que, mostra, não me pertence, certamente estarei condenando o verbo bendito a qualquer coisa mendicável, volúvel e hemorrágica , capaz de sangrar além da amenia. Deste modo, distantes os corpos e os ditos, blindado no canto esquerdo e na mente, resguardo, intactas, as memórias sonhadas vívidas por mim. Deixa assim... E pra não dizer adeus, brindemos com um velho e bom Bourbon. (é quando esqueço alguns detalhes pra lem

DEIXA ASSIM

Não foi por falta de amor, foi por zelo que me distanciei. Se mais tempo permanecesse, ele, o amor, teria se transformado em qualquer coisa dolorida e odiosa e hemorrágica. Desse modo, distanciados os corpos e os verbos, ele, o amor, continuará intacto. Deixa assim, pra não passar do ponto(final)... DEIXA ASSIM - Lena Ferreira - nov.13

POEMEU

nasci com algumas vírgulas; no in'pulso exclamações dançam na ponta da língua e as interrogações, num ato convulso, saltam da boca e a saliva ainda à míngua às vezes, os hiatos tomam meu posto e, assim como as vírgulas, de tempo em tempo, parênteses e aspas, a contragosto, explicam o que logo se esvai com o vento esses detalhes, conto eu em displicência sem intenção de comover quem quer que seja pois, normalmente, vou espalhando reticências onde o bendito ponto final, seu posto almeja POEMEU – Lena Ferreira – nov.13

SUA

Tal qual um vento matutino lábios-menino, soprando leve nas cinzas do peito em greve acorda a chama julgada morta A porta, deixei entreaberta desde que choveu lá fora... - sobre a demora, dispenso explicação - Agora, enfim, reconheço: o que mais importa no calor da chama nua é que a alma, minha e sua, sua e sua e sua e sua ...não com ares de recomeço; beirando a sublimação... SUA - Lena Ferreira - nov.13

NA ORLA

Chegar juntinho com sol e inaugurar a areia fina e fofa dessa praia, é impagável. É quando o embate inglório entre as ondas de seu mar cristalino e os rochedos são mais belos. É quando o vento prestativo acalma a fúria de um sol que prenuncia um verão escandalosamente quente. É quando o céu, de um azul anil de encanto, estéril de nuvens mais se assemelha a um oceano suspenso. É quando o ar é limpo e puro ainda e leve. É quando tudo é mais bonito e nenhum instante é breve. Os sentidos se aguçam... Por toda extensão da beira-mar, um comitê de robustas rochas parecem brotar da areia fina e clara e limpa. Umas se embriagam com o recuo das ondas leves. Outras paqueram a maré cheia para fartarem-se em goles espumantes. No intervalo, trocam segredos seculares, inaudíveis aos ouvidos sensatos; não os meus. Do outro lado da estrada estreita, um morro verdejante e imponente, observa prazenteiro, o farfalhar das copas das amendoeiras que parecem gargalhar com as cócegas que o ven

FLORESÇO

Sigo a seta que acerta o alvo no escuro e nem mira , tão clara é a sua alma e admirando o riso que nasce fácil, alvo e puro de quem vai à guerra desarmada, tão senhora de si, emudeço... Teço um verso do avesso... Lavando as vestes da alma num azul, profundo e manso bebo da calma que, gentilmente, me oferece - que tanto preciso... e que, penso, mereço - e, descansando na imensidão das marés de mim, armada com um silêncio breve, floresço... FLORESÇO - Lena Ferreira -

VELHO TEMA

melhor voltar, urgente, ao velho tema versando sobre o amor que engrandece a alma, com palavras que enternece o coração que, preso num dilema, enxerga, em toda lida, um problema nos braços da tristeza, se esquece alimentando a mágoa que entristece e contamina as letras do poema melhor voltar, urgente, ao tema antigo; pareces pouco mais que um mendigo pedinte das migalhas de atenção escute bem o que agora te digo: exercitando o velho tema, amigo, acalmarás tua alma e o coração VELHO TEMA - Lena Ferreira -

NÁUFRAGO

É difícil o trajeto que percorro navegando nessas águas sempre frias - de saudade, de tristeza, de agonias -  distante dos teus braços em socorro  Eu me afogo em ondas de tristes lembranças onde o teu silêncio já calou meu grito onde o amor, que parecia tão bonito viu  morrer a força e a esperança É difícil o trajeto e os detalhes que deixaste na memória em entalhes - marcas fundas, doloridas, de desprezo -   É difícil... Não há possibilidade   - sem teus braços, nessas ondas de saudade, impossível que eu ainda saia ileso... - NÁUFRAGO - Lena Ferreira -

PRECISO

Enquanto a noite ensaia sua estréia, cuidadosa, a mente, nada cautelosa, saltita em descompassados passos arranhando o piso liso da razão que se dissolve no ar a cada piscar desses olhos já pesados que, a essa altura, bem pouco enxergam. Passaram, à tarde, nuvens rubras, tensas, grávidas de alarde, reclamando-me postura. Passaram ventos prestes a parir torturas, ventanias arrancando-me a ternu ra. Pássaros, voos, urdiduras; já pressinto temporais. Nada preciso... Preciso, urgentemente, de uma brisa leve e quente a limpar a alma, a mente e o rosto e o gosto desse dia. Deitar num chão de nuvens costuradas com estrelas e admirar o sol nascer bem manso no entreabrir desses seus lábios tão macios enquanto, suave, amanhece em minha noite. PRECISO - Lena Ferreira - nov.13

BENDIGO

Bendigo o dia quando ele amanhece e agradeço a oportunidade com uma curta e silenciosa prece; simples mas plena em sinceridade Bendigo os passos e também tropeços as pedras, as flores e bendigo o vento a chuva, o sol, o fim e  o recomeço; bendigo  todo e qualquer momento Bendigo a força que me leva à luta; com muito amor e correta conduta vou bendizendo cada hora do dia Bendigo a tarde que a noite traz bendigo cada instante de paz que encontro ao me entregar à poesia. BENDIGO - Lena Ferreira – nov.13

LÍQUIDOS

O céu, coalhado de nuvens alaranjadas, anunciava mais um dia de calor infernal mas eles, que vinham de uma noite transpirada, não se importavam com o que estava por vir; abasteceram-se de líquidos madrugados, saciando sedes para mais de um dia...E embora a promessa desse sol que se levantava fosse de inferno, dois sorrisos cúmplices se abriram, satisfeitos e certos de mais uma lua no paraíso. LÍQUIDOS - Lena Ferreira -

SOLFERINOS

Suaves sensações socorrem a pele se sopra sutilmente seus segredos nos sussurros suspirados, me excedo respira os movimentos e lhe impele Secretos, os silêncios são despertos sibilam solfejadas sinfonias em sopros solferinos, são libertos sussurros, suavidades, poesias Silencioso, o solo sacrossanto segrega sensações; todas dormentes suspiram as sedas, sorrindo no canto saciando os segredos mais frementes SOLFERINOS - Lena Ferreira -

ESTAÇÕES

Quando meu peito inverna chovo forte - trovejando ventanias alago o leito em prantos - Nessas horas, seu sol-riso vem, mansinho e dissolve as nuvens gris do meu pensamento-temporal Sopra seu hálito de brisa morna secando todos os cantos Recolhe as folhas do meu outono semeando com tanta ternura Cuida do meu território inteiro para receber a sua primavera ESTAÇÕES – Lena Ferreira –

A VIA

Havia o som dos silêncios aflitos que divisava o espaço entre a boca e a pele suspiros suspensos causando arrepios e alguns segredos macios prestes a desabrochar Havia o abismo infundado e arredio que separava o voo do seu arremesso em linha tão tênue, em sede-precipício e o avesso da calma querendo queimar Havia o desejo incontido, fremente que inflava o peito em batidas fatais em descompasso à razão; rarefeito e muitas gotas a nos encharcar Havia, e a via, do meio ao princípio recomeçava até que, ao final entre espasmos, sussurros, sem frio morremos, plenos, dentro de um olhar A VIA - Lena Ferreira

AOS PURISTAS

Os catorze que aqui vão, sem disciplina, rasgam regras e não prestam continência no quartel da academia de excelência: mancos, pobres, loucos; babam na rotina São catorze desafetos às retinas embotadas e com pouca paciência; logo deitam o selo de incompetência no soldado que faz o que não domina São catorze e mesmo presos pela rima são tão livres por fazerem o que primam mesmo com dura censura nessa forma São catorze! Livres, sim, da pretensão de alcançarem, seja um dia, o escalão almejado pelos presos a uma norma AOS PURISTAS - Lena Ferreira  - abril/13

PERFUME

Faltou-me falar desse silêncio que, estagnado, paralisa as águas de um límpido lago enquanto penso, num tom quase amargo, nas coisas frias que ainda me cercam...nas coisas tristes que ainda me abraçam. Esse silêncio mordisca o meu orgulho enquanto, teimosa, revisito insossos planos do insano mundo onde, acho, me perco em inúmeras e fúteis considerações...rodando e rodando em círculos sofríveis. Faltou-me falar desse silêncio profano que, calando aquela brisa tão confortante, aponta-me erros vários, improváveis, impalpáveis, na tentativa de desviar o foco de si e, num tom intrigante, sisudo e assaz, arranca-me as folhas da memória, quase confusa... E sse silêncio, tão moço, fossiliza-me as veias e, no confronto com essas letras tortas, tenta levar consigo o melhor do meu sorriso. Duelo inútil...Desiste, deixando-me às margens do lago límpido onde enfim decido afogar essas palavras inaudíveis e moucas...Vedo meus ouvidos para as falácias fúteis. Deito os meus olhos

VISUAL

Jamais se iluda com a aparência; nela não encontrará a essência que, em verdade, reside nos atos Correndo, vivemos num mundo profundo, profano e imundo onde fotos já não revelam fatos VISUAL – Lena Ferreira- nov.13

CHOVIA

Silente, ela observava o rio que a conduzia mas não sorria. Deixava-se levar simplesmente. E o rio corria, calmamente. Enquanto ia, lembranças infantes esbarravam pelas duas margens e calavam fundo. Que mundo... - pensava arredia... - Enquanto torcia chegasse o seu porto seguro, pedia que o céu, tão ardente, bebesse o estio, a dor, a agonia e a morte. Vem, sorte! - dizia - E, sem covardia, chore, inclemente no solo dos órfãos sedentos. E de seus rebentos. E enquanto pedia, era ela quem chovia... CHOVIA - Lena Ferreira -

LUA NOVA

Semicerrados, olhares se observam arteiros, em promessas absurdas invadem os meios inteiros e se instalam nos tantos cantos escusos, recatados Semioculta, a lua, cheia em fases bisbilhota esse comportamento infante: quatro olhinhos brincando de verdades duas bocas salivando diálogos silentes Nascem promessas avessas e caras florescem gramas nas areias da praia e uma brisa mole e morna destila o ar ouvindo o suspiro da noite em quases Pausando no vão dessas frases não ditas brindam com olhares na taça da calma e seguindo o universo na alteração da rota mudam a fase cheia para uma lua nova LUA NOVA – Lena Ferreira -

LEGADO

Admirava aquele velho. Carregava uma bagagem de vida sem peso e sem poeira e diante de uma desfeita, sempre dizia: - um copo d'água, por favor. Preciso molhar a palavra. Durante algum tempo aquela expressão me inquietou mas observando suas atitudes sensatas nessas horas, foi que entendi. Molhar a palavra para que não saiam ásperas, para que elas deslizem, para que não firam; uma pausa, um pretexto, talvez, para uma rápida reflexão. Passei a admirá-lo ainda mais. Era mestre nas contações de causos, sempre análogos, sempre reflexivos, sempre deixando lições grandiosas. Já por fim, abandonou o presente, refugiando-se num passado confortável. Foi triste vê-lo assim, ausente de tudo, de todos, do mundo...Partiu, nem cedo nem tarde, mas deixou este legado que hoje procuro empregar: um copo d'agua, por favor...Preciso molhar a palavra! LEGADO - Lena Ferreira -

IMPULSO

E a distração das noites intermináveis e vazias era nomear os detalhes frágeis dessa trama: lágrimas de ensaio, risos em disfarce, desculpa sem nexo e o plexo, drama em pulso avulso Impulso... Quase nada disso ressoava ou convencia solidão e melancolia, indesejáveis, alargavam o quarto vasculhado a fundo pelos olhos rasos na busca infinda pelos detalhes estáveis IMPULSO - Lena Ferreira –

ASFIXIA

Sob os hiatos excessivos e aflitos vão os conflitos recolhidos pela estrada e não há nada, por enquanto, que amenize a agonia que esta lua sempre traz Paira no ar o peso dO ser inconstante num tom cortante, o pensamento atrofia Por covardia, os pés miúdos desta noite caminham, calmos, pra não acordarem o sol. ASFIXIA – Lena Ferreira – 

PERDÃO

Eu peço perdão por te amar desse jeito que, ao mesmo tempo, te atrai e repele é que há um mar aqui dentro do peito que, por rebeldia, vem à flor da pele Em toda maré, da mudança, o efeito se mostra mais claro e então me impele a mil desvarios - loucura ou defeito? - alterando rotas, por mais que se apele E quando te afastas, eu corro a procura com os olhos molhados, cheios de ternura e, usando palavras suaves, de paz, Te peço perdão mas dispenso a cura aceite ou não, nessa minha loucura encontro razão pra te amar mais e mais PERDÃO – Lena Ferreira -

LUA

Sonhei-me vento no arrepio da pele morena onde, nua, bronzeava-me com seus dedos de sol Sonhei-me vento na fogueira que anima o peito onde, nua, embolava-me nos seus pelos-lençol Sonhei-me vento neste verso que sai sem medo onde, nua, deliro abrasando-nos além do arrebol Sonhei-me vento... Mas a razão me acorda e avisa: És só lua...Aceita, é tempo; jamais beijarás o sol... LUA – Lena Ferreira –

PERMITO-ME

Aprendi com a primavera, sem descaso, a me deixar cortar, perdendo as folhas: mesmo ficando com esses olhos rasos aceito as consequências das escolhas Inútil é insistir ser flor num vaso que presta a sufocar nossas raízes entenda, não foi obra do acaso; eu tenho consciência dos deslizes Assim, me deixo ir pelas estações outono invernos e também verões como se fossem, sempre, as primeiras Sempre fiel às minhas emoções permito-me provar das sensações gozosas a quem sempre volta inteira PERMITO-ME - Lena Ferreira -

CULTIVO

Na esquina das desconhecências íntimas, um campo largo de tímidos sorrisos se insinua às sementes de silêncios semeados pelas outras estações. Cultivo. É primavera. Logo, logo, verão o desabrochar do verbo. CULTIVO - Lena Ferreira -

SÍNCOPE

Vou... aconchegar-me-ei no teu cansaço que, de tanto divagares, andas farto e falta-te o ar no peito inteiro, todo Vou... e dar-te-ei um pouco do meu muito vento que, cá, rega os meus impulsos em galopes extremados cardiovascularizando a pele; penso ...que assim serias meu, bem como já sou tua e suo na subida da colina, longe, alta, horizonte ensolarado - tanto, tanto que, fechando os olhos, me atiro - Voo... e pouso nesses braços fortes, destino escolhido, apalpo a calma - novidade nesta vida - que exala das tuas mãos e boca e pele tateio as bordas do sossego tão sincero que ofereces ...acarinhando a tua face, sinto que, silenciosamente, a alma minha se despede purpurinada à brisa vaga, calmamente, desfaleço... SÍNCOPE - Lena Ferreira -

VOO

É na voragem beirando a ingenuidade que hoje confesso alguns temores bobos, tolos: altura, escuro, vãs promessas e lonjura correndo o risco de expor-me; fútil e frágil Essas tolices fazem-me tremer a alma e, se abalam fortemente a estrutura desconsertando os passos momentaneamente, ao mesmo tempo servem-me de desafio Pois se a vida solicita mais coragem esses temores dão asas ao meu impulso e quando avisto o meu medo inconfessável, mesmo tremendo convulsivamente, voo VOO – Lena Ferreira –

rio manso

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... no leito de um manso rio deito as horas, deito os dias pensamentos, agonias saudades, mortes, tristezas deito dúvidas e certezas num misto de calor e frio - eu sou mar e ele é rio... - vou fazendo o que o rio faz deixo que vá, deixo ir embora vãos momentos, vãos agoras seguem com a mansa corrente libertando a minha mente de tudo o que ficou pra trás - eu sou mar e ele é rio... - vendo a vida com mais brio invertendo o curso das águas limpando as margens das mágoas retomo os remos do barco e o meu destino, demarco sem temor ou arrepio - sendo mar, me penso rio... -  – Lena Ferreira –

SEDUÇÃO

A lua, sedutora, toda encanto, desfila, pela noite - um negro véu - dependurada e nua, lá no céu; destila o breu de todo desencanto. Ao longe, ouço um lindo e terno canto num tom de voz tão doce quanto mel que invade o ambiente além do léu; sem ter um rumo certo, me levanto. Caminho a esmo pela noite fria buscando alento, sondo a poesia que está escrita na ponta da lua. A voz de longe chega a mim - tão perto - e preenchendo o meu canto deserto derrama a alma totalmente nua. SEDUÇÃO - Lena Ferreira -

VIVÊNCIA

Era dessas que, a qualquer ruído, se punha inquieta a busca o motivo e, sem nenhum motivo, buscava a razão. Não se achava enquanto se perdiam o som, o sussurro ou a estridência no ar que, pesado e estagnado por questionamentos, dificultava o seu respirar. Até que, um dia, um pássaro raro e discreto pousando em seu dedo, num canto tão terno e tão manso como um acalanto, cantou-lhe uma estória tão linda, tão viva, tão doce e veraz, semelhante a canção de ninar em notas macias, tão claras; vivência em cantar. E ninando toda a ansiedade, serenando toda a aflição, explicou-lhe que só se ouve bem com os ouvidos da alma, repousando o peito no silêncio da calma. Desde então, quando escuta o suspiro da brisa ou um vento formando temporal, abre bem os ouvidos da alma e para ponderar, se cala... VIVÊNCIA - Lena Ferreira -

ABRIGO

Abrigo de tormenta e calmaria, diriam que, por isso, sou uma atriz. Eu fiz por merecer essa bagagem - aragem passadiça, desconforto - Meu porto é inconstância permanente. Agente em céus de organza nessas fases. E as frases que me lançam em desvio são fios que, mais ais, cumularão. Se o teu senão dissesse claramente o que na mente escondes, que alegria! Mas não, só sugestão; calo em meu peito; é o jeito de seguir sem temporais. Abrigo de tormenta, calmaria e alguns ais; aguenta, alma minha, somente um pouco mais... ABRIGO - Lena Ferreira  -

PERMANÊNCIA

Há quem parta e, mesmo assim, permanece há quem se despeça mas jamais vai embora certo é que, nossa alma nunca se esquece do que lhe toca e o passado é vivo no agora Em fotos e fatos, cenários importantes em palavras ouvidas, trazidas pelo vento volta o tempo em memórias confortantes como carícias doces para o pensamento Há quem parta e deixe em nós, um pedaço há quem vá, levando um pedaço de nós há, no agora, recordações dos abraços e a certeza de nunca estaremos sós PERMANÊNCIA – Lena Ferreira – nov. 13

INEVITÁVEL

E por mais prazeroso que seja o convívio amigo entre risos e conversas e partilhas solidárias chega o tempo, inevitável, da busca solitária por uma meta necessária; um encontro comigo. Então, a desbravar o meu próprio oceano, parto sei das chances, bem prováveis, de enfrentar tormentas se os remos não bastarem, meus braços, sim, aguentam; nessa busca, comprometo-me e não me aparto. Não sei nada, quase nada do que me espera a frente desse mar que só transborda em natos segredos pode ser que me engula ao me lembrar dos medos pode ser que me afogue, me confronte, enfrente. Sal e areia, travando a garganta no confronto, tentarão impedir que a voz saia clara e calma mas não mais pensarei no provável; irei com a alma carregada com a coragem necessária para esse encontro. INEVITÁVEL -Lena Ferreira - nov.13

VENTURAS

Em torrente de sussurros infinitos dou-te a alma e convido a alma tua a venturas no entorno irrestrito; posto-me, disposta, inteiramente nua Mas é teu silêncio e esse ar contrito que responde o verso e a rima pobre, sua; já não sei, ao certo, o que mais te dito mas, querendo, dou-te livre acesso à lua Dou-te estrelas; cometas constelações far-te-ei provar distintas sensações nas viagens pelas venturosas águas Se quereis, mergulhes, dar-te-ei a prova de que o verbo explicitado se comprova neste verso transbordante que deságua VENTURAS - Lena Ferreira - out.13

NINHO

Na alvorada dos seus olhos tão macios deito um olhar de estio, manso e enternecido pra descansar o desvario do mormaço Nos braços-rede, teço um ninho de aconchego e quase chego a trocar de alma contigo tão terno abrigo é a calma desse seu abraço O dia passa, a tarde acena e traz a lua eu sou só sua, nesse ninho - amor crescente - onde, contente, o tempo não dá nenhum passo NINHO – Lena Ferreira – out.13

NUVEM

Quando fui mar, tentei rasgar dois oceanos e com esse plano, me perdi nas muitas rotas das densas ondas de espumas fractais que, urgentemente, devolviam os meus ais Regurgitava o que do fundo revolvia e dissolvia a razão tão de repente sinceramente, não sabia mais se via ou imaginava o que estava à minha frente: Mais de dez vultos, embaçados, e falavam em uma língua que, entender, não conseguia mas insistiam com um sorriso convincente e a viagem, a grosso modo, prosseguia Quando fui mar, ralei a alma em rochedos por aceitar a incitação de qualquer vento - evaporei e aguardo, num céu de estio, pra deslizar no curso de um perene rio. - NUVEM - Lena Ferreira - março/13

ENQUANTO

Enquanto recolho o rastro das últimas estrelas, desembaraço os fios do pensamento em arrepio que um forte vento soprado na madrugada fez o favor de emaranhar. Caminho numa calma aparente pela areia com os pés descalços e mãos despreocupadas e a brisa que o mar respira, me abraça como entendesse a multidão que me habita nesse instante. É vasto o mundo que, em segundos, percorro e horas são caras no agora que me aflige, Sobram sombras que me assombram; são as sobras de um nada que insistia visitar. Desisto...Espraio-me na areia quase morna enquanto o mar inteiro escorre pelos meus olhos ressacados em arrastão. Embriagada de maresia, uma sonolência breve anestesia a mente aquietando temporariamente o alvoroço desses pensamentos-fios. Adormeço e sonho azul...Enquanto, de leve, os dedos do sol me fazem cafuné... ENQUANTO - Lena Ferreira - out.13

NOVEMBRO

A tarde, caminhando mansa e fresca, parecia esquecida do encontro marcado com a lua. Pássaros empoleirados nos galhos, ruflavam suas asinhas, acomodando o doce canto em seus ninhos sem penas. Enquanto isso, uma brisa leve e alegre farfalhava as folhas das árvores grávidas de sabores e aromas. Um sol alaranjado, morno e preguiçoso olhava para o horizonte com olhinhos de tristeza. Queria demorar-se um pouco mais - desejo de todos os dias, pobrezinho - esperançoso por encontrar a amada sua. Pouco a pouco, passos e gritos silenciavam suas vozes para, calmamente, poderem beber, gota a gota, toda essa cena. Vagarosamente, percebiam, um véu fino e quase negro estendendo-se na imensidão de um céu estéril de nuvens mas fértil em promessas. Era novembro chegando... E da pequena janela do quarto podia-se ver, claramente, a boca da noite cuspindo estrelas. NOVEMBRO – Lena Ferreira – nov.13

AMA

Ama de tal forma que possas enxergar através e além dos defeitos; ninguém é perfeito. Não permitas que estes bloqueiem a tua visão de amor sobre o outro...Ama de tal forma que o motivo desse amor seja o amor que em ti reside e transborda, nada mais. Ama, sem cobranças, sem palavras, sem receita; simples gestos...Ama e ama e ama até que te transformes no próprio amor... AMA – Lena Ferreira – nov.13

PESCA

Dependurada e súplice aos pés do vento roguei levasse as nuvens do meu pensamento que, monocromático, agonizante e em torturas, movimentava as atitudes mais sombrias. Prece atendida em completude, uma ternura, mansa e serena, acorda a calma adormecida. Agradecida e já com a alma em vestes de gaze dedos de nuvens lilases, colhem estrelas e cometas dos olhos úmidos que se abrem num amplo sol-riso aquarelando todo entorno ao sabor da morna brisa. Não há palavra precisa nesse instante... Então, flutuante, com a língua imersa num mar salivado por declarações silentes, nas ondas quentes, em perfume de maresia, pesco o nome soletrado pela alma - minha e tua - e que logo vem à boca, num gole só; poesia. PESCA – Lena Ferreira – nov.13