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Mostrando postagens de fevereiro, 2015

EX-PRESSA

Nem bem o dia começa um pescador arremessa sua rede no mar tranquilo Suave e isento de pressa colhe do fundo a promessa dos frutos, quilos e quilos Nessa tarefa que recomeça toda paciência é ex-pressa EX-PRESSA - Lena Ferreira - fev.15 * sobre a foto de Sebastião Salgado

COSTURA

Desde o dia inoportuno que partiste levo comigo uma caixa de costura com agulha, linha e os retalhos da jura: em momento algum mostrar semblante triste Mas, por dentro, é claro que a tristeza insiste rasga o peito em maliciosa tortura junto forças - e não cedo à amargura - costurando o rasgo e o peito, assim, resiste Desde quando tu partiste, passo os dias na costura onde os risos de alegria remendam a dor que parece não acaba Linha, agulha, jura, retalhos - suspeito que tudo na caixa esteja com defeito pois, à noite, todo trabalho desaba - COSTURA - Lena Ferreira - fev.15

MÍNIMA

Sempre haverá quem conteste Quem discorde com o que diga; Não é motivo pra briga Nem preciso que proteste No argumento que investe Se achar justo, então, prossiga Mas, como diz uma amiga, A vida é um ciclo de testes Onde, sem nos darmos conta, Usamos lápis sem ponta No  X de algumas questões Mínima é a exigência Pra salutar convivência: Respeitar opiniões MÍNIMA - Lena Ferreira - fev.15

NO ESTADO DE POESIA

Sou água que o vento embala sou nascente, sou maré sou verso de quarto e sala sou jurada, juíza e ré Sou, da arma, o tiro e a bala sou cabeça, ombro e pé sou silêncio, o grito e a fala sou madeira, o ferro e a fé Sou sereno e sou ventania sou tristeza e sou alegria sou homem e sou mulher - que a realidade recria pois, no estado de poesia, posso ser o que eu quiser - NO ESTADO DE POESIA - Lena Ferreira - fev.15

TRÍADE

A primeira escuta atenta a memória de todas as letras cores, gestos, perfume e poeira lendo as linhas reais ou sonhadas A segunda, teclado ou caneta como partículas de um cometa do que sonha às vivências ajeita dando vida às vidas inventadas A terceira, com um dos pés na lua dia a dia, desdobra-se e sua; aula e espelho, armário e cozinha quente e frio, amargo e doce No descanso, unida às outras duas complementam-se e, inteiras e nuas, bebem chá com gotas de entrelinhas que a leitura da vida lhes trouxe TRÍADE - Lena Ferreira - fev.15

DESPEÇO-ME

Despeço-me de incertas palavras e suas justificativas meramente fugazes Caminho por uma estrada de chão batido onde todos os sinônimos  ativos são alertas em placas de pacificação Despeço-me desse instante breve sorvendo o segundo do seu sopro - intenso, vibrante, ventila e vai...e voo - Despeço-me da insistente desistência sei que é o ranço do cansaço que a convida... Escrevo todos os adjetivos na areia sabendo que as ondas irão apagar este é o intento, e o desejo: que venham os verbos DESPEÇO-ME – Lena Ferreira – fev.15

ΕΓΩ

Eu, que, de versos vãos, vivo livrando o peito incontido alivio o meu mormaço Eu, que, de vento em não, vibro ventilando os meus sentidos refresco o meu cansaço Eu, que sedento pela vida bebo goles fartos, cheios sinto que a sede não passa Eu, que, insistente nessa lida, traço passos pelos meios sinto que é só por pirraça ΕΓΩ  - Lena Ferreira -

gota d'água

Imagem
*** Gota d’água que namora com uma brisa Flerto com vórtices e volúveis ventanias Onde as rimas retas ricas não se atrevem E as palavras mais macias não tem cela Nasci sorrindo na beirada de um abismo De onde os verbos lisos arredam dois passos Alimentei a sede em vão do vinho verde E na textura à tinta extinta, pinço nuvens Pressinto longe tempestade, céu vermelho Apronto os pés que, em ponta, aponta o precipício Lançando-me num  seco, solto e cego salto Redimo o peso de uma  improvável pena E nos segundos que sucedem essa queda -mero respingo, evaporando, evaporando - Em tudo penso e do que penso nada sei E antes mesmo de tocar solo,  nada sou GOTA D’ÁGUA  - Lena Ferreira - fev.15 -para Inspiraturas - Oficina de lirismo - Quem sou?

PELOS JARDINS DA VELHA CASA

Andei pelos jardins da velha casa onde lembranças com asas conduziram-me a um passado assim, não tão distante quando os passos, que ainda eram macios, pisavam disciplinados, repletos de cuidados para não espantar as tímidas borboletas enquanto as mãos, que ainda eram delicadas, afofavam o terreno amplo, limpo e produtivo e semeavam , zelosas,  grãos de sonhos, de amores de cores de sorrisos Andei por onde os olhos, cheios, cheios vislumbraram um paraíso com pontes sem muros Andei pelos jardins da velha casa e apesar do corpo em brasa e desses pés já tão pesados e dessas mãos já calejadas as asas dessas lembranças em sobrevoo, à  alma lassa, devolveram  esperanças aos montes, com juros PELOS JARDINS DA VELHA CASA - Lena Ferreira - jan.15 *para a Oficina Inspiraturas - Por onde andei

SE

Hora de arrumar a velha estante. Abrir espaço para os novos sem descartar os antigos. Nessa tarefa complicada (porque o móvel é bem pequeno e os pobrezinhos vivem em saia justa), ao reagrupar os de Drummond, um de Rubem veio ao chão  com as suas reticências exibidas já capa provocando reflexões. "Se eu pudesse viver a minha vida novamente..." Conseguiu o seu intento. Fora um presente generoso da amiga Stella Maris na Bienal de 2009. Lembrei-me instantaneamente do momento. E do sentido. Foi bom. Deixei de lado a arrumação e debrucei-me na releitura. Releituras são bem interessantes. Na época, a semente do que dizia já na introdução incomodou-me um tanto, mas não cheguei a concluir se concordava ou discordava com o que o Mestre dizia:  "Se eu pudesse viver a minha vida novamente, eu quereria vivê-la do  mesmo jeito como vivi, com seus enganos, fracassos e equívocos. Doidices? (...)" Mas deleitei-me com o restante da leitura, repletas de traços de delicadeza e no

DE ESQUECER

Teu nome, de esquecer, passou do tempo dizia-me a razão desde o princípio das alucinações em precipício nos despropósitos ditos ao vento [teu nome, tão sonoro, tão bonito valsa com a língua pelo rubro espaço chegando à alma como um terno abraço deixando em sua pele um verso escrito] Teu nome, esquecer, diga-me como se quanto menos falo, mais eu somo realidade ao sonho em que debruço? Teu nome, viro lua, se me esqueço e sendo tu o sol que não aqueço deixo escapar teu nome entre soluços DE ESQUECER - Lena Ferreira - fev.15

IRMÃ DO OCEANO

A concha esperando na areia serena e tranquila pela preamar guardou as urgências no vento bebendo do instante o seu sussurrar enquanto a maré na vazante bem longe se encontra do seu transbordar a concha preenche sua espera com o que considera ao silenciar quando o mar beijar toda a praia promessas alfaias irão se quebrar e a concha, tranquila e serena irmã do oceano, voltará pro lar IRMÃ DO OCEANO – Lena Ferreira - fev.15