SINAIS
Era tarde. Horas altas. Após considerar as tantas faltas, abriu
a porta gradeada que dava para a varanda e com passos decididos, cruzou o curto
espaço que a separava do portão de ferro, preso ao muro já sem reboco, prestes
a cair. Firme, empurrou a tramela e alcançou a rua comprida e escura. Consigo,
levava somente a roupa do corpo e uma breve sensação de liberdade que há muito
não experimentava. Deixou a chave
pendurada na porta, por dentro. A mala, desfeita, jogada aos pés da cama e,
encostada à mesa do canto da sala, uma história incompleta a qual decidira não
escrever mais. Respirou fundo e
seguiu em frente sem olhar para trás. A cada passo dado, rememorava os dias, os
meses e os anos entre planos desperdiçados e desenganos com os quais,
consciente, permitia, pouco a pouco, se anular.
Uma única lágrima ensaiou
alisar o seu rosto magro por todo desgosto passado. Mas, passou e porque
sobrevivera até ali, engoliu. Não seria a vez primeira. Mas, a última, jurara.
Com os pés pesados pelo desgaste das idas e
voltas, das tentativas inúteis de reescrever os capítulos e de alguns descuidos
com certas grafias, as mãos tremiam e os passos eram diminutos. Assim, não
conseguira chegar muito longe. Parou logo na esquina, diante de uma
encruzilhada.
Enquanto descansava os pés, o pensamento caminhava na
velocidade dos carros que, pelo adiantado da hora, ultrapassavam os sinais.
Os sinais. Foram eles
que a empurraram àquela decisão: palavras ao vento, frases secas, sem
sentimento, muitos ‘sim’ querendo ser ‘não’, discursos vazios, em vão, desprovidos
de gestos. E o resto, nem valeria a pena mencionar. Não mais.
(...)
Os sinais. Ficaram vermelhos; para os carros e para a velha
história. Fim da linha. Ponto final.
Para ela, sinal verde. O sentido? Sentir e ir, além do
papel, escrever um novo enredo e, sem medo, permitir-se à entrega ao papel principal.
SINAIS - Lena Ferreira - dez.14
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