AOS POUCOS


Já não morava mais em si quando a razão bateu-lhe à porta cobrando explicação. Do que, já nem se lembrava na verdade. A última visão com claridade foi aquele olhar inquisitivo acerca dos deslizes recorrentes. Lembra-se bem que, na hora, só riu. Um riso largo que, exibindo os dentes, escondia perfeitamente o que caminhava por dentro. Quantas estradas...Quantas curvas camufladas em linha reta... Ninguém sabia. Enquanto ria, percorria o interior em busca da resposta que não vinha e, adivinha? Na procura, deparou-se com cicatrizes remotas, semi anestesiadas.
- Susto! Supunha-as cauterizadas!
Ah, essa alma que não cala. Ah, essa alma que, só, fala. Fala, fala e fala alto!
Resultado: aos sobressaltos, os cortes acordaram, murmurando dores, estios, temores, sangrando lamentos, impingindo-lhe tormentos...
Rasgou-lhe, então, um olhar estupefato, catatônico.
Da vírgula pro hiato, dois pontos: quisera um ditongo, uníssono, leve, marcado indelével no peito por dentro, pulsando e pulsando incessantemente. E a espera.
Aos poucos, vejo-o voltando novamente para a 'casa'. Carrega um golinho de razão bem na ponta dos seus dedos. Faxina, aos poucos, alguns dos medos. Retira o pó de alguns segredos, aos poucos. Pondera... Cauteriza, pouco a pouco, essa sangria enquanto ri um riso inteiro e espera...Pela cura, loucura ou poesia (o que vier primeiro).


AOS POUCOS - Lena Ferreira – jun.14

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